E esta tal Liberdade ... Por: Leandro Cardoso e Carlos Eduardo Gomes

Lamartine Lima, Luitgarde Oliveira, Leandro Cardoso, Ivanilde Leite e Manoel Severo no Cariri Cangaço em Porteiras, 2013.

Fala Doutor Leandro Cardoso... "A sensação de liberdade, na verdade, nunca foi "consciente" por parte das cangaceiras. O simples fato de deixarem para trás a "rigidez moral, sexual e de comportamento daquela sociedade, por si só já é uma quebra de correntes, e, portanto, libertação. Lembremo-nos que as cangaceiras fugiam com seus companheiros para viver maritalmente, sem efetivamente casar. E muitas tiveram mais de um companheiro naquela vida. Ou seja: uma micro-revolução sexual. 

Muitas moçoilas sertanejas FUGIAM PARA CASAR com seus noivos, escondidas, quando o consórcio não era aceito por seus genitores. O rapto da noiva até era aceito socialmente, mas ficar sem casar, não (pois seria visto como prostituição). Aí está mais uma ruptura com o padrão socialmente aceito da época. Outro ponto a considerar: o cangaço não era visto pelos jovens como uma guerra, mas sim como uma opção de meio de vida, uma aventura, com a qual elas (e os sertanejos em geral) se identificavam (o chamado escudo ético). 


Maria Bonita

Dessa forma, as vítimas eram fundamentalmente jovens que, mesmo "ouvindo falar" dos riscos, mergulhavam naquela aventura de ouro, guerreiros bonitos e o mundão sem esquina. Os cangaciros caíam no cangaço por necessidade; as cangaceiras, por opção (na maioria das vezes). E, só para encerrar: o cangaço seduziu também mulheres mais velhas, como Dona Delfina, que chegou a ser presa em Canindé do São Francisco por ser coiteira fiel do Rei do Cangaço. O cangaço era sedutor.

Com a palavra Carlos Eduardo Gomes..."Entendo perfeitamente seu raciocínio e estou de acordo. Muitas mulheres acompanharam seus namorados, ou simplesmente foram atraidas para o cangaço em busca da liberdade. Minha tese é de que elas trocaram a rigidez moral, pela vida sem sossego e violenta, sem nunca terem encontrado a liberdade que buscavam. 

Antônio Tomaz, Carlos Eduardo, Ângelo Osmiro e Afranio Cisne no Cariri Cangaço Crato, 2011

Outro ponto importante que você aborda no seu comentário, é a opção pelo cangaço como forma de buscar um meio de vida mais fácil. Importantíssima essa sua citação: “o cangaço não era visto pelos jovens como uma guerra, mas sim como uma opção de meio de vida, uma aventura, com a qual elas (e os sertanejos em geral) se identificavam (o chamado escudo ético). Dessa forma, as vítimas eram fundamentalmente jovens que, mesmo "ouvindo falar" dos riscos, mergulhavam naquela aventura de ouro, guerreiros bonitos e o mundão sem esquina”. Não posso concordar em chamar de vítimas os que tentavam fazer sua vida roubando e matando seus conterrâneos. Não sei contar se os que fizeram a opção pelo cangaço para ter uma vida melhor foram maioria ou não. Falando do cangaço de Lampião, talvez possa ser. 


Leandro, a história do cangaço, em especial a fase de Lampião, tem um colorido muito atraente, fascina muita gente pela valentia, pela busca da vida sem lei nem rei. Mas quando você observa em detalhes o método do Rei dos Cangaceiros, é claro que a rebeldia é substituida pela composição com os donos do poder. Acho que foi Frederico P Mello que chamou Lampião de Coronel sem Terras. A mais pura verdade. 

Dou muita importância ao que os cangaceios disseram. No meu entendimento ao dizer que vinha se dando muito bem no negócio, em 1926, na entrevista do Juazeiro, Lampião confessa seu objetivo, sem deixar dúvidas. Fora as outras evidências de que liderava uma organização criminosa bem montada. 

Estou aguardando ansioso pelo seu prometido trabalho sobre Sinhô Pereira. O cangaço não é só Lampião, embora saibamos que o Cego é o astro rei."

Antônio Vilela, Sousa Neto, Leandro Cardoso, Jorge Renígio, Manoel Severo e Ivanildo Silveira no Cariri Cangaço Barro, 2013

Leandro Cardoso:"Você tocou no X da questão: Lampião sim era um coronel itinerante. E, segundo Sabino Bassetti, inaugurou o "Caixa Eletrônico" no sertão (só que com o dinheiro alheio). O cego véio (no dizer de Maria Bonita) efetivou um cangaço alcaponiano, diferente, no seu cerne, do cangaço-de-revides de Sinhô Pereira e Luis Padre. 

Eles tem, sim, pontos em comum; mas o que manteve na ativa cada capitão-de-cangaço parece bastante diverso. Quanto ao meu trabalho, estou escrevendo algo sobre Sinhô, com algumas coisinhas que descobri, principalmente sobre a "grande fuga". Vamos aguardar !

Leandro Cardoso Fernandes; Teresina PI
Médico, pesquisador, escritor

Sócio da SBEC, Conselheiro Cariri Cangaço

Carlos Eduardo Gomes; Rio de Janeiro RJ
Empresário, membro do Cariri Cangaço

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