Estudo para Cordel: O julgamento de Lampião Por: Rangel Alves da Costa


Apolônio dos Santos disse, Francisco das Chagas Batista confirmou, que cordel estendido em barbante é o ouro do nordeste, coisa igual a diamante, pois conta sua história todinha, sem deixar nem um nadinha, do passado e do instante.

Escrever cordel é lavourar, é plantar e semear, é jogar o grão pelo chão e colher sua razão, sem se importar que o doutor despreze tanta lição. Doutor mesmo é Zé Limeira, é Gonçalo Ferreira da Silva, é João Melchiades Ferreira, Zé Pacheco e Zé Costa Leite, é Leandro Gomes de Barros. Todos na academia, do clarear a luz do dia e rimar sertão em poesia.

Todo mundo pega o mote, vai correndo feito trote, juntando rima em magote para uma história contar. E eu queria, meu Senhor, também ser do sertão um doutor pra falar de Lampião, coisa demais debatida, mas ainda não resolvida, sobre o maior Capitão.

É por isso que eu vou botar anel de doutor, pegar a pena e espora, pra falar do homem agora sem deixar nada de fora. Vou fazer o seu julgamento, sem defender ou acusar, apenas tentar mostrar se no processo nordestino sentenciado ele está.





Virgulino Lampião, pra cada um de um jeito, cabra safado pra uns e pra outros de respeito, refletindo nas palavras do homem todo o seu conceito. Verdade seja bem dita que é até coisa maldita falar mal de sujeito sem lhe conhecer direito. Do mesmo jeito é verdade que não há necessidade dizer que era santinho se cometia maldade.

Lampião era gente, de carne e osso e sangue, sentia na sua pele tudo que o homem sente, por ser assim tão normal, era de fazer o bem sem estar livre do mal. Na ação reagia, se perguntado respondia, sentia tristeza por dentro e por fora era alegria, por lutar de fogo a sangue naquilo que defendia.

Primeiro é preciso saber que nenhum badalo existe sem sino, não existiu o Lampião sem antes o Virgulino. Como todo homem de bem, se de repente chega alguém logo querendo desfeita, ou dá o troco em seguida ou se afrouxa pra toda vida. E assim aconteceu que naquele sertão de breu, quando um parente morreu o Lampião se acendeu e pegou o seu clarão, seguindo pelo sertão numa predestinação.




Destinado ele estava a viver eterna guerra, trincheira no pé de serra, no mosquetão que não emperra. E fez juramento consigo de correr qualquer perigo pra combater o inimigo, o problema era saber onde ele ia arrumar tanta inimizade pra combater, pois não se sabe por que fazia conchavo com rico e o pobre a padecer. 

Se sua intenção era vingar os carrascos da família, então foi além dessa ilha, quis ir muito adiante e entrou numa armadilha. Mas se pensava em contra tudo lutar, então tinha que saber de qual lado ia ficar e não fazer de sua luta uma verdadeira disputa com qual coronel partilhar, como se o poder precisasse proteção, se não querer que Lampião tombasse logo no chão.

Mas isso é o menor, pois tudo que ele fez o homem não estava só. Ao seu lado o inocente, o sertanejo valente, fazendo da caatinga um norte e jogando a própria sorte sem nem imaginar na morte. Rapaz de pouca idade, mocinha na puberdade, uma verdadeira menina, seguindo aquela sina, descendo barranco, morro acima, somente para a história que hoje tanto sublima.

Não foi capeta nem santo, nem pouca coisa nem tanto, não apunhalou inocente nem matou tanta gente, não fez tanta malvadeza nem nunca foi de gentileza, nunca deu nada de graça sem levar junto a desgraça, nunca pisou num chão que não fosse com devoção, mas nunca devotou passar a mão em quem na merecia perdão, era na bala e no punhal, era no tal do mosquetão.




A história de Angico só cabe noutro processo, pra saber se houve o cerco ou ele enganou com sucesso. Alcino desconfia que toda aquele enredo está guardado em segredo pra história desvendar, já outros mais apressados não cansam de afirmar que o cansado Capitão despediu foi mesmo lá.

Assim foi o Lampião de sobrenome sertão. Acusado de bandido, pela história absolvido, mas havendo apelação, querendo inocentar Virgulino e destruir Lampião.

Rangel Alves da Costa

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